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10 de dezembro de 2024 - 19:19h

A Folha Agrícola

Abelhas africanizadas são úteis, mas se defendem

Por Décio Luiz Gazzoni, Engenheiro Agrônomo, pesquisador da Embrapa Soja, membro do Conselho Agro Sustentável e do Conselho Científico da A.B.E.L.H.A.

Existem abelhas que não ferroam, como as da tribo Meliponini. E existem as que ferroam, como a abelha africanizada ou as mamangavas. As ferroadas podem ser bem dolorosas e, às vezes, podem causar sérios problemas, dependendo da sensibilidade da pessoa, do fato de ser alérgica à toxina da abelha, da quantidade de picadas e do volume de toxina injetada.

           Costuma-se falar que as abelhas são agressivas, mas, na realidade, são defensivas. As abelhas africanizadas se defendem ferroando o agressor, quando elas sentem que alguém está ameaçando sua sobrevivência ou a integridade de suas colônias.

           No ser humano, quando ocorre uma agressão ao organismo, com a presença de uma substância exógena, o sistema imunológico é acionado, como forma de proteção, para evitar danos e até salvar a vida. A reação do organismo à picada varia desde uma pequena inflamação com eritema, vermelhidão e coceira no local da picada, até sintomas muito graves como paralisação da respiração e problemas cardíacos.

           Nos casos mais graves, os principais sintomas são uma sensação generalizada de mal-estar, formigamento, tontura, coceira e urticária. Ocorre um inchaço nos lábios e na língua, seguida de obstrução das vias aéreas, com dificuldade para respirar, taquicardia, queda de pressão e sudorese intensa. Outros sintomas incluem dispneia, sibilância, estridor, disartria, disfonia, astenia, confusão, sensação de morte iminente, cianose, incontinência dos esfíncteres, podendo chegar até à perda de consciência, anafilaxia e colapso orgânico.

Veneno e reação

           As abelhas injetam entre 50-100 µg de veneno por picada, podendo atingir até 300 µg, que é o conteúdo máximo do saco de veneno. O veneno das abelhas é constituído por peptídeos, uma mistura complexa de aminas biogênicas e proteínas de alto peso molecular, em sua maioria enzimas. A melitina é o principal componente do veneno das abelhas, chegando até 50% do peso do veneno seco. É composta de 26 aminoácidos e podem ocasionar a destruição de hemácias, leucócitos e hepatócitos. O alérgeno mais importante é a fosfolipase A2, uma glicoproteína composta por 134 aminoácidos, cuja atividade está relacionada à degradação das membranas. Outro alérgeno é a hialuronidase, que hidrolisa o ácido hialurônico e facilita a difusão do veneno através do tecido conectivo.

           O sistema imunológico reage a qualquer substância estranha injetada no organismo, que pode vir de saliva, veneno, anticoagulantes ou toxinas. Pode parecer contraditório que o sistema de defesa do organismo seja responsável por uma reação que possa causar problemas tão sérios. Porém a resposta imunológica é uma característica com diferenças entre organismos, e a intensidade da reação pode variar de leve até muito intensa. Quando a toxina da abelha é injetada em um organismo, os mastócitos – que são células que compõem o sistema imunológico – produzem anticorpos para neutralizar a toxina. Quando os anticorpos entram em contato com a toxina, ocorrem reações químicas, com a concomitante liberação de histamina pelos mastócitos. A histamina é responsável pelo incremento da circulação sanguínea, o que explica os primeiros sintomas, como vermelhidão, edema e coceira.

           Até aí tudo vai bem. O problema ocorre em organismos supersensíveis, o que deflagra os sintomas graves acima descritos que, em casos extremos, podem levar o indivíduo picado a óbito. De acordo com as estatísticas, cerca de 70 pessoas morrem a cada ano nos EUA, em decorrência de picadas de abelhas. No Brasil, conforme o SINITOX do Ministério da Saúde, os acidentes com animais peçonhentos – que inclui as abelhas - representam a segunda causa de acidentes toxicológicos, logo abaixo dos medicamentos, porém não há referência específica sobre o número de intoxicações causadas por abelhas.

Cuidados

           O primeiro cuidado é sempre manter-se afastado dos locais onde existam abelhas, evitando bulir com as mesmas ou tomar qualquer atitude que possa ser interpretada como ameaça a uma abelha isolada ou à uma colônia.

           Ao observar o ataque, se o ferrão ainda está preso à pele, é importante remove-lo imediatamente, para cessar a instilação de toxinas. Quando surgem os primeiros sintomas que vão além da dor ou edema local e, especialmente, se a pessoa picada é alérgica ou tem antecedentes de reações por picadas de abelhas, deve ser encaminhada com urgência para um hospital, onde receberá o tratamento adequado.

           A remoção das colônias de abelhas situadas em lugares públicos ou residências deve ser efetuada por profissionais devidamente treinados e protegidos com EPIs específicos para a lida com abelhas.

           As principais recomendações para evitar acidentes com abelhas incluem:

a.      Manter distância das colônias de abelhas africanizadas;

b.      Caso a aproximação seja necessária, a pessoa deve estar protegida com vestuário e equipamentos adequados (macacão, luvas, máscara, botas, fumigador, etc.);

c.       Não circular e, especialmente, não fazer movimentos bruscos, na rota de voo das abelhas;

d.      Na proximidade com abelhas, evitar ruídos irritantes (tratores, ceifadeiras, motores barulhentos), usar perfumes ou desodorantes, apresentar odor de suor humano e usar cores escuras (principalmente preta e azul-marinho), pois essas ações estão associadas com ataque de abelhas.

           Abelhas são muito úteis, tanto pelos seus produtos – mel, cera, própolis – quanto pelo serviço ecossistêmico de polinização, que tanto favorece cultivos e a vida silvestre. Mas, como todo o ser vivo, possuem mecanismos de proteção à sua própria vida e de sua comunidade, razão pela qual deve-se respeitar as regras básicas para evitar acidentes com as mesmas.

Abelha africanizada. Crédito: Décio Luiz Gazzoni

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