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18 de junho de 2025 - 16:09h

A Folha Agrícola

Planejamento sucessório rural é o pilar da sustentabilidade do agronegócio brasileiro

Por: Álvaro Santos*

A perpetuação das atividades do agronegócio brasileiro, que representa parcela significativa do PIB nacional, depende não apenas de técnicas agrícolas modernas ou da expansão do mercado internacional. Um dos pilares mais negligenciados, porém, decisivos para a continuidade e estabilidade das propriedades rurais, é o planejamento sucessório.

Infelizmente, a ausência de um planejamento estruturado ainda é a regra, e não a exceção, nas fazendas brasileiras. Tal omissão resulta em insegurança jurídica, conflitos familiares, perda de eficiência produtiva e custos tributários desnecessários. Como advogado especializado nas áreas tributária e agrária, constato, com frequência alarmante, que muitos só se atentam à importância da sucessão patrimonial após o falecimento do líder familiar – momento em que já se instaurou um litígio ou um processo oneroso de inventário.

É necessário compreender que a sucessão rural se divide em duas esferas complementares: a sucessão da gestão e a sucessão patrimonial. No primeiro caso, estamos diante da transição do comando operacional/liderança estratégica da fazenda. É fundamental que a família estabeleça, previamente, quem dará continuidade à gestão do negócio – seja um herdeiro, um CEO externo ou mesmo por meio de arrendamento da propriedade.

Contudo, é na sucessão patrimonial que se concentram os maiores riscos jurídicos e tributários, e onde o advogado assume papel central. A alternativa tradicional – o processo de inventário – implica custos elevados, longos prazos e grande possibilidade de disputas entre os herdeiros. Além do imposto sobre transmissão causa mortis (ITCMD), que pode chegar a 8% em alguns estados, há honorários advocatícios, que pode variar de 10% a 20% do valor patrimônio (depende de o inventário é amigável ou conflituoso), soma-se as custas judiciais e cartorárias, podendo ter ainda a paralisação ou instabilidade da gestão da propriedade durante esse período.

Planejamento Sucessório

Diferentemente do inventário, o planejamento sucessório busca a forma menos onerosa, mais rápida e juridicamente segura de transferir o patrimônio rural para as futuras gerações. Trata-se de um conjunto de estratégias legais voltadas à organização da sucessão, ao planejamento tributário e à implementação de princípios de governança corporativa.

Nesse contexto, a profissionalização da gestão familiar por meio da governança é essencial. Instituir regras claras de sucessão, definir papéis entre os membros da família e estabelecer mecanismos de solução de conflitos são passos fundamentais para garantir a estabilidade e a longevidade do negócio rural. Com esse planejamento patrimonial, aumenta a confiança entre os sócios e os stakeholders daquele negócio (colaboradores, fornecedores, compradores e clientes).

O planejamento patrimonial envolve três pilares fundamentais: organização da sucessão, cuidado tributário e governança corporativa. O ordenamento jurídico brasileiro oferece diversos instrumentos para esse planejamento, entre os principais, destaco:

  • Doação em vida: Permite a transferência de bens com incidência imediata do ITCMD. Apesar de mais rápida, requer o pagamento de tributos e custas cartorárias.
  • Testamento: Instrumento formal para manifestar a vontade do proprietário sobre a divisão dos bens. Não evita o inventário, mas pode reduzir conflitos e conferir previsibilidade.
  • Holding familiar: Estrutura societária criada para gerir os ativos rurais. Nela, os bens são integralizados como capital social e transformados em cotas, que podem ser transferidas entre familiares. Com planejamento adequado, essa ferramenta permite economia tributária, proteção patrimonial e maior controle da sucessão. Também haverá custos a depender de onde essa holding foi constituída.

momento certo da decisão e cuidados

Não há necessidade de esperar a velhice ou um evento fatal para pensar na sucessão. Se a família já possui uma propriedade com atividade produtiva, geração de receitas, estrutura administrativa e múltiplos sócios – ainda que informais –, já há justificativa suficiente para iniciar o processo de planejamento. Essa recomendação aplica-se inclusive a arrendatários, que, embora não detenham a propriedade da terra, possuem capital imobilizado em maquinários, insumos, estoques e direitos contratuais que devem ser resguardados juridicamente.

A principal indicação é que esse planejamento sucessório, especialmente no meio rural, deve ser conduzido por advogados especializados, com atuação multidisciplinar e profunda compreensão das peculiaridades tributárias, fundiárias e sucessórias do setor. É crucial alertar os produtores sobre o crescimento de serviços ofertados por profissionais e empresas sem a qualificação técnica necessária. Já são numerosos os casos de holdings mal constituídas, testamentos contestados judicialmente e doações realizadas com vícios formais, que culminam em litígios fiscais e familiares prolongados.

Portanto, finalizo reforçando a importância do tema para os produtores rurais, pois planejar a sucessão no agro não é um luxo, é uma necessidade estratégica e jurídica. Trata-se de um investimento na longevidade da atividade produtiva, na proteção do patrimônio e na harmonia familiar. Procrastinar essa decisão pode custar caro – não apenas financeiramente, mas também em termos de legado.


*Advogado Tributarista e Agrarista – Especialista em planejamento patrimonial e sucessório no agronegócio.