Gislene Titon — Doutoranda em Geografia (linha Meio Ambiente); Nutricionista e Pedagoga, Mestre em Gestão e Desenvolvimento Regional
A agricultura familiar representa um pilar fundamental na luta por segurança alimentar, sustentabilidade ecológica e justiça territorial. Com base em uma lógica de produção voltada para a diversidade, a subsistência e os laços comunitários, ela se contrapõe ao modelo hegemônico do agronegócio, intensivo em agrotóxicos, energia e capital.
Como aponta o Dicionário Político da Articulação Agro é Fogo (2023), o discurso de que “o agro é tudo” invisibiliza as práticas dos povos do campo, das florestas e das águas, assimilando suas formas de produção à lógica do mercado e das monoculturas. Em minha atuação como nutricionista, observo que a alimentação produzida nesses sistemas agroecológicos não é apenas mais saudável, mas carrega consigo uma complexa rede de saberes, afetos e resistências.
Como pesquisadora da linha de Meio Ambiente na Geografia, compreendo o território como construção socioespacial onde se materializam disputas políticas, culturais e ecológicas. Nesse sentido, experiências como a do NEA-FB (Núcleo de Estudos em Agroecologia de Francisco Beltrão), analisadas no Relatório PIBIS (2023), mostram que a organização de grupos de consumo agroecológico fortalece vínculos entre produção e consumo, promovendo a educação alimentar e a valorização do alimento local e orgânico.
Assim, a agricultura familiar agroecológica é mais do que produção de alimentos: é resistência ativa aos processos de espoliação da terra, de violência ambiental e de apagamento cultural promovidos pela lógica da “fronteira agrícola”. Como reforça o Dossiê Agro é Fogo (2023), o avanço da monocultura está diretamente relacionado à grilagem, desmatamento e uso do fogo como instrumento de expulsão de comunidades tradicionais.
Dessa forma, reafirmar o papel da agricultura familiar na construção de sistemas alimentares sustentáveis é uma questão de justiça social, climática e alimentar. Os territórios camponeses são, sobretudo, territórios de vida.