Por Adalberto Junqueira, Gestor de Unidade de Negócios da Tractebel Brasil, Chile e Canadá
Elementos de terras raras é um grupo de 17 metais estratégicos encontrados na natureza, geralmente misturados a outros minérios e de difícil extração. Apesar do nome, não são necessariamente raros — mas são difíceis de isolar em alta pureza, o que torna o processo complexo. Esses materiais tornaram-se insumos fundamentais em tecnologias limpas e avançadas, de geradores eólicos a motores de veículos elétricos, passando por smartphones e sistemas de defesa.
A demanda global por esses materiais cresce em ritmo acelerado: em 2020 foram extraídas cerca de 240 mil toneladas de óxidos de terras raras, volume que saltou para 390 mil toneladas em 2024, segundo o Serviço Geológico dos Estados Unidos (USGS, ou United States Geological Survey).
Além disso, projeções da Agência Internacional de Energia indicam um aumento de até sete vezes na procura por esses elementos até 2040, impulsionado pela transição energética e pela digitalização da economia.
Para o Brasil, há um enorme potencial de aproveitamento desses materiais. Estudos indicam que o país possui cerca de 21 milhões de toneladas de óxidos de terras raras em reservas – aproximadamente 23% das reservas mundiais, a segunda maior proporção global, atrás apenas da China. As principais ocorrências mapeadas distribuem-se em estados como Goiás, Minas Gerais, Amazonas e Bahia. Porém, apesar dessa riqueza natural, a produção nacional ainda é insignificante, em torno de 1% da oferta mundial.
Até pouco tempo, nenhuma mina de terras raras operava comercialmente no país; somente em 2024 teve início a primeira exploração industrial, a mina Serra Verde em Goiás. Especialistas estimam que, com investimentos adequados, o Brasil poderia suprir até 10% da demanda global nos próximos anos – uma meta ambiciosa que reflete tanto as oportunidades quanto os desafios para o setor.
A urgência em desenvolver esse potencial também se explica pelo panorama externo: a cadeia global de terras raras é altamente concentrada. A China responde por cerca de 60% da extração e quase 90% do refino desses elementos, o que leva outras potências a buscar fornecedores alternativos. Desta forma, o Brasil aparece como candidato natural a suprir parte da demanda diversificada – e até por isso que o governo dos Estados Unidos, por exemplo, manifestou seu interesse em acessar as reservas brasileiras.
Entraves institucionais e sustentabilidade
Embora disponha dos recursos minerais, o Brasil precisa enfrentar importantes entraves institucionais para viabilizar projetos de terras raras. Um dos principais é o complexo licenciamento ambiental. A falta de clareza regulatória e a morosidade dos trâmites desestimulam investimentos – atualmente, obter todas as autorizações para um projeto de mineração pode levar até 16 anos no país.
A preocupação ambiental não é infundada. A extração e, principalmente, o processamento de terras raras podem gerar resíduos químicos tóxicos e mesmo materiais radioativos, caso não haja controles adequados. Assim, qualquer projeto deve incorporar soluções de sustentabilidade desde o início.
Superar os entraves institucionais requer também articulação entre múltiplos setores. O governo já reconhece que é preciso um esforço integrado: recentemente, quatro ministérios (MME, MCTI, MDIC e MF) debateram juntos os desafios das terras raras, sinalizando a necessidade imperiosa de articulação para destravar o setor.
No Legislativo, discute-se a criação de uma Política Nacional de Minerais Críticos e Estratégicos, para coordenar ações e instrumentos voltados a esses recursos. Além disso, minerais estratégicos foram incluídos como prioridade em diversos planos federais recentes (do PAC a programas de transição energética), refletindo o caráter transversal do tema.
Desafios técnicos: separação e inovação
No front técnico, o ponto crucial dos projetos de terras raras está no processamento e separação química dos elementos. Embora esses metais não sejam literalmente raros na natureza, eles geralmente ocorrem juntos e com propriedades semelhantes, o que torna sua separação individual extremamente complexa e onerosa. É nessa etapa que se agrega a maior parte do valor: o refino completo de um concentrado pode elevar em 20 vezes seu valor de mercado.
O Brasil ainda engatinha nesse segmento de alta tecnologia – não há, até o momento, plantas industriais de separação de terras raras no país. Com isso, o padrão tem sido exportar compostos mistos de menor valor para que a separação final ocorra no exterior. Muitas empresas optam por esse caminho por falta de confiança na capacidade local, apesar de centros de pesquisa nacionais já dominarem técnicas laboratoriais de separação.
Para superar esse déficit, será preciso investir de forma contínua em ciência, tecnologia e inovação, além do investimento em plantas para produção massiva e o desenvolvimento de fornecedores especializados. Alguns programas de pesquisa já formaram especialistas e permitiram avanços práticos, como a inauguração em 2024 da primeira unidade piloto para produção de ímãs de terras raras no país em Lagoa Santa, Minas Gerais. Embora de porte modesto frente à produção asiática, essa iniciativa demonstra que é possível fabricar componentes de alto valor agregado com tecnologia nacional.
Estratégias para viabilização
Em síntese, viabilizar projetos de terras raras no Brasil exige o avanço em várias frentes: será preciso modernizar regras, acelerando licenciamentos com segurança jurídica, estimular investimentos, e fortalecer a base tecnológica. Também é fundamental promover a agregação de valor local, garantindo que uma parcela crescente do refino e da fabricação de componentes ocorra no país, em vez de se limitar à exportação do concentrado. Dessa forma, a riqueza mineral poderá se traduzir em riqueza industrial e tecnológica, gerando empregos qualificados e reduzindo vulnerabilidades externas.
Com a demanda global em expansão e a transição energética em curso, o Brasil tem em mãos uma oportunidade única de passar de fornecedor de minério bruto a ator de ponta na nova economia verde. Com as terras raras, o Brasil poderá transformar seu potencial em realidade sustentável, consolidando-se como protagonista global no fornecimento desses minérios.
Sobre a Tractebel
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